quarta-feira, 3 de julho de 2013

FÉ E CIÊNCIA



FÉ E CIÊNCIA
                                                               Avelina Maria Noronha de Almeida
                                                                                                                   avelinaconselheirolafaiete@gmail.com

            No ano passado, o cardeal italiano Dom Zenon Grocholewski, expressando-se sobre a Fé em uma homilia no Santuário do Pai Eterno, em Trindade, Goiás, o faz de uma forma belíssima:
            “A Fé é como a noite, uma noite escura iluminada de estrelas. Mas não é verdade que a durante a noite se vê menos? Não é verdade que à noite se vê menos. Ao contrário. Durante a noite se vê muito mais. Durante o dia, sim, vemos muito mais claramente, mais precisamente. Porém vemos pouco; vemos somente o que nos circunda. Nosso campo visual é mui limitado. Durante a noite certamente vemos com menor claridade, com menos precisão, porém vemos mais plenamente, mais longe, vemos as estrelas que estão afastada de nós milhões de anos luz.”
            Dizem que não somos do tamanho da nossa altura, mas do tamanho do que vemos. Pois esse cardeal disse que, mirando as estrelas, sentia-se grande, que a vida dele não estava limitada à realidade terrena, mas, sim, “incrustada em um fascinante, encantador e imenso Universo”.
            Lembrei-me dessas palavras vendo diversas imagens captadas pelo Telescópio Espacial Hubble, um satélite astronômico artificial que transporta um grande telescópio lançado pela NASA em 1990. As visões e informações que ele nos traz são fascinantes. Por exemplo, a Nebulosa de Orion com a luz vermelha indicando a emissão por nitrogênio; a luz verde, por hidrogênio; e a azul por oxigênio. A Nebulosa do Cisne é vista como um oceano de hidrogênio com pequenas quantidades de oxigênio, enxofre e outros elementos.
            E veio ao meu pensamento uma associação entre a Fé e o Telescópio Hubble. Santo Tomás de Aquino nos fala de cinco vias para se provar a existência de Deus. E a que vem agora ao caso é a Quinta Via, segundo a qual a ordem sempre remete a um Sapientíssimo Planejador e Ordenador, um Organizador sumamente inteligente, de admirável sabedoria formando uma unidade sábia, harmônica e bela. Imaginem só, numa lonjura de muitos milhares, milhões de anos luz vislumbramos as mesmas cores, estão os mesmos elementos químicos encontrados em nosso mundo pequeno diante da grandiosidade de outros corpos celestes, numa correlação em que se conjugam  as mesmas leis, encadeados num conjunto de causa e efeito, obedecendo a um plano que faz da Criação uma incrível e admirável unidade. Um cientista ex-ateu, Scheleich, fez o seguinte depoimento: “Tornei-me religioso por meio de um microscópio e da contemplação da natureza”.
Diante do que mostra o Hubble, só temos que admirar a grandeza do Universo e louvar ao Criador por sua obra. Como diz Dante, em De Monarchia 13.2:

“Deus aeternus arte sua, quae natura est.” (Deus é eterno por sua obra, que é a natureza)

CIDADE DOS LIVROS E DAS FLORES





CIDADE DOS LIVROS E DAS FLORES
                                                                            Avelina Maria Noronha de Almeida
                                                                                     

            Muitos sois já se passaram desde que os índios Carijós chegaram em busca da “terra sem males”.  Se não a encontraram, ajudaram a escrever uma história iluminada por muitos sois, mesmo que às vezes encobertos pelas nuvens.
            Várias alusões felizes já foram feitas sobre nossa terra. O “Tratado de Geografia Descritiva da Província de Minas Gerais”, de 1878, assim se refere a Queluz: “No município fabricam-se ótimos tecidos de algodão e lã, que já foram premiados na exposição mineira; também se fabricam as afamadas violas, conhecidas pelo nome de Violas de Queluz e ali também fazem-se as muitas panelas de pedra, ótimas para a cozinha e de todos esses gêneros faz-se grande exportação.”
               Em seu livro “Minhas Recordações”, Francisco de Paula Ferreira de Rezende, que foi Juiz de Direito aqui em meados do século XIX, diz ser Queluz  um dos celeiros de Ouro Preto e, mais ainda, que as colchas fabricadas em S. Gonçalo, apesar de caras, eram muito compradas e até mesmo enviadas para as princesas europeias.
              Mas uma referência muito citada ultimamente é a de Nelson de Senna, no Anuário de Minas Gerais, em princípios do século passado, dizendo ser Queluz um reduto de intelectuais, que o povo daqui amava os livros e não havia casa que não tivesse ao menos uma flor. Fazendo uma comparação com os nossos tempos, também temos uma falange de intelectuais, alguns com projeção fora de nossos limites territoriais; está crescendo a atração pelos livros, de modo muito especial nas escolas, dando o destaque ao Movimento Caravelas, da Academia de Ciências e Letras de Conselheiro Lafayette, desenvolvido pela acadêmica Leda Maria Augusta Vieira de Faria.
Quanto às flores, não estamos correspondendo aos velhos tempos, embora em alguns logradouros grande número de casas ostentem jardins e muros onde se debruçam lindas trepadeiras, principalmente bouganvilles. Eu me lembro das primeiras dessas flores que vi em minha vida, menina ainda, quando Dr. Mário Rodrigues Pereira, então prefeito, mandou trazê-las para enfeitar a Praça Barão de Queluz, e hoje ainda lá se encontram. Também, aqui e ali, encontramos ipês e outras árvores que nos brindam com sua floração.
            Mas quando viajo na Internet e vejo certas ruas em cidades da França, da Itália, da Espanha e de outros países, fico encantada com os vasos de flores de espaço em espaço nas calçadas e aquelas casas que não têm jardim com flores nas janelas, ou vasos pendurados nas paredes e nos muros, numa profusão de cores e encantamentos.
            Como seria bom se Conselheiro Lafaiete fosse assim... Seríamos realmente uma Cidade das Flores e do Livros. Não é um “Sonho de uma noite de Verão”, mas um sonho de véspera de Primavera. Como sonhar não custa nada... Diz Aristóteles: “Spes est vigilantis somnium” (A esperança é o sonho do homem acordado)

Observação: O artigo foi publicado em princípios de setembro.

CIDADE GENTIL




CIDADE GENTIL
                                                         Avelina Maria Noronha de Almeida

            No filme “Suplício de uma Saudade”, de 1955, ambientado em Hong Kong durante a Guerra da Coréia, a médica eurasiana Han Suyin (Jennifer Jones), quando interpelada pelo correspondente de guerra americano Mark (William Holden) sobre como, tendo nova visão de vida, iria enfrentar a rigidez da tradição  na volta à terra natal, revela com que recurso iria vencer o desafio:
            - Não há força maior no mundo que a gentileza.
            A jovem médica iria opor, aos costumes milenares, uma atitude simples, mas que, acreditava, derrubaria as barreiras.
            Estamos cansados de ver a prepotência, a arrogância e a brutalidade tornarem o mundo um lugar cada vez mais difícil de se viver. Dos mais poderosos aos mais humildes, em todos os quadrantes da Terra, há uma legião de seres humanos que lançam, entre si, farpas, insultos, rumores perigosos de ódio, ameaças que, muitas vezes, se transformam em agressão verdadeira. Se houvesse uma onda de  gentileza, não seria, esta, doce e eficiente arma na reversão do  triste quadro?
            Para isso, não é necessário abandonar o nosso cotidiano como o fez  o Profeta Gentileza, José Datrino. Após o incêndio do “Gran Circus Norte-Americano em Niterói, no dia 17 de dezembro de 1961, às vésperas do Natal, vitimando mais de 500 pessoas, a maioria crianças, o empresário desligou-se de todo apego ao material. Durante anos trabalhou no local da triste ocorrência e transformou, o que eram cinzas e marcas do incêndio, numa linda plantação de flores. Com túnica branca e longas barbas, pintou mensagens de paz, amor e gentileza nas pilastras do viaduto do Caju e em  outros lugares do Rio de Janeiro. Saía também por várias cidades levando sua mensagem, inclusive veio várias vezes a Lafaiete.
            Entre suas frases destaca-se: “Gentileza gera gentileza”, que já fora dita por Erasmo (Adágia 1.1.34): “Gratia gratiam parit.”
            Imaginem uma cidade que aderisse à campanha do profeta e seus habitantes escrevessem, dentro das residências e na entrada das lojas, escritórios, repartições, escolas, farmácias, restaurantes, meios de locomoção e outros locais um pedido: SEJA GENTIL! E se a maioria dos cidadãos atendesse ao apelo, quem sabe ela receberia o título de “CIDADE GENTIL”? Pode parecer ou ser utopia, mas seria lindo, não?
            Ovídio, no verso 1.2.183, em Ars Amatoria, fala sobre a poderosa força da gentileza:

            “Obsequium tigresque domat Numidas que leones” (A gentileza doma os tigres e os leões da Numídia).

UM BELO EXEMPLO




UM BELO EXEMPLO

Avelina Maria Noronha de Almeida
                                                                                                            avelinaconselheirolafaiete@gmail.com

Um dos personagens da Mitologia Grega,  Sísifo, foi condenado a rolar, por toda a Eternidade, até o cume de uma montanha, uma grande pedra de mármore. Quando a pedra alcançava o topo, uma força irresistível a fazia rolar montanha abaixo, obrigando-o a repetir, incessantemente, a inglória tarefa. Sísifo é um arquétipo que se pode aplicar à grande parte da humanidade que vive presa à inutilidade de esforços, ao trabalho sem sentido ou ideal ou sem a persistência inteligente que leva a alcançar uma vitória por mais custosa que seja.
Felizmente, nem todos se entregam à rotina estéril ou à resignação sem luta. Há muita gente que consegue superar desafios praticamente impossíveis de resolução e faz com que seus esforços na subida se tornem vitoriosos e se consolidem no topo da montanha.
Como exemplo, cito um brasileiro que, a custo de muita luta, conseguiu superar obstáculos e realizar importante e benéfica empreitada: Christiano Benedicto Ottoni, por muitos conhecido apenas como nome de nossa vizinha cidade. Vale a pena conhecer um pouco de sua brilhante trajetória.
Como seu nome é conhecido e grafado atualmente, Cristiano Otoni foi um engenheiro que atuou na construção das linhas da Estrada de Ferro Central do Brasil. Em um momento de sua vida profissional, recebeu a incumbência de estudar, orçar e construir a estrada que ligasse o Rio de Janeiro a Minas Gerais passando através da Cordilheira. A princípio também incrédúlo, como ele mesmo diz “estava nas sombras da dúvida”, vítima das tergiversações do governo, chamado com ironia de “engenheiro amador”, de repente tomou-se de coragem. Aceitou o desafio e, não se intimidando, dedicou-se de corpo e alma a bem resolver o problema da passagem da Cordilheira, como se encontra em sua autobiografia:  “...cresceu-me verdadeira ambição de atravessar a Serra e acabar o túnel grande, principalmente quando se propagou a crença da sua impraticabilidade. Por isso permaneci no posto, a despeito de todas as contrariedades”.
Enfrentou intrigas, lutas, chacotas, trabalhos agitadíssimos, desgostos, ataques de jornais... mas também “prazeres do amor próprio”. Censuravam-no dizendo que a empresa, do modo como ele planejara, seria um desperdício, que  ficaria em dois milhões de esterlinas e o governo não deveria aprovar o projeto pois o que nele estava proposto não se faria nem em vinte anos. Fazendo cortes e aterros colossais, o genial engenheiro realizou uma obra de alta magnitude, com toda a solidez, em 7 anos e, também, com economia, pois custou 10 mil contos em lugar dos dois milhões de esterlinos que seriam cobrados pelo outro concorrente.
Considerado o “Pai das Estradas de Ferro do Brasil”, Cristiano Otoni é um belo exemplo para se contrapor à tibiez do mito de Sísifo. Cabe-lhe bem o dístico estampado em nosso chafariz da Praça Barão de Queluz:
Assíduo vir propositi tenax omnia vincit” (Pela perseverança o homem de propósito firme tudo vence).


OS GANSOS DO CAPITÓLIO





OS GANSOS DO CAPITÓLIO
                            Avelina Maria Noronha de Almeida
                                                           avelinaconselheirolafaiete@gmail.com

            No ano de 390 a.C. Roma fora invadida pelos bárbaros, homens corpulentos, ferozes, valentes e fortes. Muitos habitantes e soldados fugiram, mas alguns romanos articularam uma resistência no Capitólio, o principal templo do Império Romano, localizado na colina do mesmo nome. Dali jogavam pedras, flechas, o que tivessem à mão contra os inimigos que tentassem escalar as escarpadas rochas, ou mesmo lutavam corpo a corpo com os que chegavam até a amurada.
            No templo havia uns gansos, considerados sagrados. Por diversas vezes, quando a fome os afligia, os romanos sentiam-se até tentados a devorá-los, mas sempre resistiram a cometer aquele sacrilégio. 
Uma noite, Mânlio, um jovem soldado, dormindo ao lado de sua espada, acordou assustado com o grasnar agudo e desesperado das aves sagradas, o qual cortava angustiado o silêncio da noite. Acercando-se da amurada, viu-se frente a frente com um gaulês que tentava escalá-la e conseguiu impedi-lo do intento. Porém foram surgindo mais inimigos. Continuando com a gritaria, os animais acordaram os outros soldados, que vieram em socorro de Mânlio e conseguiram defender o templo com sucesso.
                Foi assim que os gansos, alertando os romanos e salvando-os de serem completamente derrotados, passaram a ser símbolo da importância de estar atentos. Dizia Monteiro Lobato: “O preço da liberdade é uma vigilância barulhenta como a dos gansos do Capitólio”.
Não deixam de ser também gritos de alerta, embora “mudos” (desculpem o paradoxo), mas  igualmente assustadores, os dos peixes que aparecem mortos pela poluição dos rios e mares. Quem não se impressionou com imagens como as de seres marinhos, pelas praias, cobertos de petróleo?...
            É bom lembrar o episódio acima, contado no livro Leviatã, de Thomas Hobbes, sobre os animais, eles que desempenham um papel importante na vida humana, defendendo, conduzindo, acompanhando, distraindo,  fazendo resgates,  pastoreando, guiando cegos e, entre tanta coisa mais, alertando...
E mais: enquanto tantas pessoas destroem, queimam, poluem, degradam a natureza, diversas espécies dessas criaturas, os chamadas “animais-jardineiros” espalham sementes promovendo o reflorestamento para minimizar os efeitos maléficos produzidos provocados pela ação de seres humanos. 
Quantas lições nos dão os “irmãos animais” tão amados por São Francisco!
E, se alertam protegendo contra um mal, também sinalizam acontecimentos positivos, como aquela pomba que trouxe no bico uma folha nova de oliveira para a arca de Noé, ou  as andorinhas anunciando a luminosidade do verão, as quais, por andarem juntas, dão exemplo de união, alertando para que não nos fechemos no individualismo.  Já diziam os romanos:
Una hirundo non facit ver. (Uma andorinha só não faz verão)