LAFAIETE
CRESCEU MUITO
Avelina Maria Noronha de Almeida
Garimpando aqui e ali num filão
riquíssimo que se aprofunda na imprensa antiga de Conselheiro Lafaiete, reli
artigos e a coluna “Tempos Idos e Vividos” do excelente jornal “O Processo”,
que era editado em princípios da década de 70. Nessa coluna colocavam notícias,
recolhidas em jornais bem antigos, três gigantes da Cultura Lafaietense:
Antônio Luiz Perdigão, Alberto Libânio Rodrigues e o próprio diretor do jornal,
Alexandre Antônio Nepomuceno. Pensei, então, em transcrever algumas dessas
notícias.
Um artigo que muito apreciei é da lavra de
outro grande intelectual, Edson Condé, que mantinha uma seção chamada “Crônica
da Cidade”. No texto Edson faz uma análise muito bem feita dos esforços de um
povo para o progresso de sua cidade, desde o princípio do século XX até aquele
ano de 1972. O artigo começa assim, num estilo muito bonito, muito poético:
“Não é preciso que se tenha em mãos
os detalhes do último censo para que se possa dizer: ‘Lafaiete cresceu e
muito!’
Nos idos de ontem, quando se
caminhava até a entrada da Rua Benjamim Constant, poucos passos adiante já se
encontrava a vegetação brava e se caminhava num longo ermo até que se atingisse
o Bairro Santa Matilde. Tinha-se a impressão de se encontrar em pleno campo
sentindo-se nas narinas o odor das urzes e nos ouvidos os cantos dos pássaros. O ruído
característicos das aglomerações nos saíam dos sentidos para ceder lugar à solidão
do aberto, da vastidão azul-esverdeada que se abria à nossa frente. Num raro ou
noutro, zunia um automóvel pela estrada poeirenta, os pneus cantando nos
pedregulhos brutos, pintando, de amarelo-barro, o capim alto à beira da
estrada. Pelas encostas e recôncavos, alheiava aos passantes o gado ralo
ruminando preguiçosamente ao langor da tarde ensolarada e quieta. Podiam se
ouvir à distância o grito e o alarido dos moleques a se banharem no rio, a
maioria deles escapos aos bancos das escolas. E sentia-se no ar – úmido ali o
cheiro da terra molhada mesclado ao odor do estrume e do cheiro da vegetação
que medrava livremente naqueles sítios.
Era o campo às portas da cidade,
que se estendia para cima e para diante, anunciando-se no brilho negro dos
trilhos da estrada de ferro.”
O texto continua discorrendo sobre a cidade analisando vários setores do
desenvolvimento atingido naquele ano em que foi escrito. E ele termina assim o
retrospecto:
“Não nos volvamos mais para o
passado. Com a cabeça erguida, olhemos para a frente, para um futuro próximo de
gigante e que só no fundo do coração nos fique a remota lembrança de uma
cidadezinha que se estendia para cima e para diante, anunciando-se no brilho
negro dos trilhos de ferro.”
Antes de transcrever o que recolhi em “O Processo”, apresento a cópia de
um documento citado nas Ephemerides Mineiras de José Pedro Xavier da Veiga,
Volume I. Trata-se de um decreto de março de 1837 (ortografia da época):
“Lei mineira nº 60. – Auctoriza o
governo a estabelecer aulas de latim, francez, philosophia, rethorica,
geographia e historia nas comarcas da província onde não houver collegios
públicos ou particulares em que se ensinem tais matérias e a criar as mesmas
aulas em circulos literarios constituidos, cada um, de duas comarcas das menos
populosas, designando o governo e a séde; e contêm outras disposições
desenvolvendo e melhorando o ensino publico na província.”
Queluz foi beneficiada com essa lei. Bernardo Joaquim da Silva Guimarães,
em 1873, veio para nossa cidade lecionar Latim e Francês, aqui residindo alguns
anos. Durante o tempo em que aqui esteve, escreveu, entre outras obras, o
célebre romance “A Escrava Isaura”, editado em 1875. Adaptado para a TV, a
novela e o livro tiveram enorme repercussão pelo mundo. O escritor residia num
casarão da rua Barão de Suassuí, onde se localiza o Supermercado Epa, em frente
à travessa Padre Américo.
Como disse Condé, devemos com “a
cabeça erguida,” olhar “ para a frente, para um futuro próximo de
gigante”, mas, “no fundo do coração
nos fique a remota lembrança de uma cidadezinha” que soube ser grande em
sua simplicidade porque...
“Bane legacies antiquates does non garantee posterus.” (Quem
não guarda o passado não garante o futuro.)